segunda-feira, 5 de abril de 2010

O Pianista


Ele não tinha nada mais do que o seu piano de cauda e um coração quase parando. No fundo sabia que não adiantava ficar daquele jeito, nada a traria de volta. Mas para ele de nada adiantava continuar a vida, pois sua única vida havia partido para nunca mais voltar. Suas canções nunca mais seriam as mesmas sem aqueles sonoros acordes que saiam do violon selo que ela lidamente tocava. Com ela também foi embora o amor, o romance, o amante, o artista, o pianista, o tudo que ele havia sido até agora. Debruçado sobre o piano ele chorava como uma criança. Nenhuma noite nunca mais teria tantas estrelas como as que eles se amavam, nenhum raio de sol seria tão radiante quanto os que nela refletiam em seus passeios diurnos. Nenhum sorriso que não fosse de uma lembrança boa nasceria em seu rosto novamente. Ele sabia que estava morto por dentro. Sofria cada vez que acordava pela manhã e o outro lado da cama permanecia frio e vazio. Quisera ele ter a sorte de nunca mais acordar. Passado um bom tempo, ele não tinha ânimo algum para tocar, mas no fundo sabia que devia isso a ela. Que enquanto vivesse, tocar piano seria a única homenagem que poderia fazer a ela. E por isso ele tocava. Só por isso, e por mais nada. Para ele de nada valia os longos aplausos e nem os generosos cachês, pois ela não estava aqui para compartilhar isso com ele.
E o tempo se passou e ele continuava todas as manhãs debruçado sobre o seu piano esperando que em algum momento, a visse novamente, nem que fosse pela ultima vez, nem que fosse por um mísero segundo, nem que fosse sua loucura se manifestando. Ele só queria guardar consigo aquele olhar que lhe transmitia a paz novamente.
E ele viveu(?) mais longos setenta anos sem ela. Com o tempo veio o mal de Alzheimer e durante esse tempo, não houve um dia sequer em que dela não lembrasse. Esqueceu-se de tudo, até de como se tocava piano. Mas todas as manhãs, de chuva ou de sol, contava para uma enfermeira sua bela história de amor.
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